quinta-feira, 13 de setembro de 2012

“Lula é um símbolo que há muito tempo ultrapassou as fronteiras brasileiras”, diz editor da revista África 21 no Brasil Arquivo Pessoal João Belisário, publicitário e jornalista Arquivo PessoalArquivo Pessoal A “África 21” é uma revista mensal angolana que tem fortes laços com o Brasil. Parte de sua tiragem é impressa e distribuída no Brasil, e os dois idealizadores do projeto, o jornalista, escritor e deputado angolano João Melo e o jornalista português Carlos Pinto Santos já moraram por aqui. A África 21 é a única revista em língua portuguesa criada e dirigida por africanos, sobre a realidade africana atual. O Instituto Lula conversou com João Belisario, representante e redator da revista no Brasil. Jornalista e publicitário, João comemora a expansão das relações entre Brasil e África e destacou “Lula é um símbolo que há muito tempo ultrapassou as fronteiras brasileiras” e é reconhecido como um grande amigo dos povos africanos especialmente “por sua postura frente aos problemas internacionais, mantendo-se ao lado dos países que querem desenvolver e ver a sua população livres da fome e da miséria”. Leia abaixo a entrevista completa: Como nasceu a África 21? A África 21 nasceu de uma ideia inicial do jornalista, escritor e deputado angolano João Melo – que já morou no Brasil como correspondente de imprensa, nos anos 80, e tem livros publicados aqui pela Record – e do jornalista português Carlos Pinto Santos, que também já morou em nosso país, quando trabalhava na revista Cadernos do Terceiro Mundo. A África 21 é a única revista em língua portuguesa sobre temas da atualidade africana e também da realidade lusófona fundada e editada por africanos, com a colaboração de jornalistas de outras nacionalidades, espalhados por vários continentes. Quais são as diferenças entre fazer revista para o público brasileiro e o africano? Embora eu seja brasileiro nunca fiz revista para brasileiros. Acho que há grandes diferenças e tambem semelhanças entre os dois públicos. Tantas quantas existem também entre as realidades políticas, sociais, culturais e educacionais. Talvez, devido á quantidade de línguas e culturas existentes na África seja mais difícil encontrar jornalistas e especialistas que conheçam e escrevam com propriedade em português sobre todo o continente africano. Muitos desses jornalistas vivem e trabalham em outros países, tanto na Europa como nas Américas. Por que é importante que os brasileiros tenham mais informação sobre a África? O passado, o presente e o provavelmente o futuro do Brasil estão intimamente unidos ao do continente africano e essa ligação tornou-se mais importante após o fim do ciclo colonial bem como o fim do regime de apartheid na África do Sul. Os contatos antes restritos à área comercial evoluiram para a área cultural, para literatura, para o teatro, para a produção agricola e industrial, para a produção de TV e música. Em todas as áreas começa a haver maior intercâmbio. Os países africanos estão crescendo cada vez mais e são grandes aliados do Brasil no campo internacional. Na realidade conhecer a África, é preencher um vazio histórico no pais que tem a maior população de afrodescendentes fora da própria África. Não podemos nos esquecer de que a informação histórica e atual sobre a realidade africana que circula na sociedade brasileira é quase nula, com todas as consequências disso resultantes, internas (preconceitos, exclusão, construção de uma identidade limitada) e externas (barreiras a uma maior aproximação com os países africanos). Que imagem os africanos têm hoje do ex-presidente Lula? O ex-presidente Lula é uma pessoa muito popular e querida na África, não apenas pelos seus dirigentes mas sobretudo pelas populações que dele tem notícia. Creio que isso se deve não apenas às informações positivas sobre o seu governo ou pela politica institucional de aproximação do Brasil com o continente africano, mas por sua postura frente aos problemas internacionais, mantendo-se ao lado dos países que querem desenvolver e ver a sua população livres da fome e da miséria. Lula é um símbolo que há muito tempo ultrapassou as fronteiras brasileiras. Penso também que o que os africanos admiram nele são as suas origens humildes, caraterísticas pessoais de liderança, sua capacidade de resolver os problemas com negociação, seu discurso franco e direto. Nesse sentido vêem-no como um grande amigo dos povos africanos. Como vocês vêem as relações da África com o Brasil hoje? Em expansão, a todos os níveis, econômico, social, político e cultural. Acho que existe uma predisposição muito grande tanto dos países africanos como do governo brasileiro para aprofundar essa relação. Quais são hoje os principais temas em ebulição no continente africano? Temos conflitos em vários países, de norte a sul do continente, tanto devido às constantes ingerências externas de países que ainda veem o continente como um local para saque, como das contradições internas mais recentes do pós-independencia. Na maioria dos paísses africanos já não existem mais grupos étnicos que vivem de tanga e sob o comando de um chefe tradicional. As coisas estão mudando. As novas estruturas sociais institucionais, eu diria, se sobrepõem às estruturas tradicionais, mas o tradicional ainda cumpre e cumprirá um papel importante em todos os países. Temos que ver quais os demais fatores que emperram hoje o desenvolvimento e os grandes esforços que estão a ser feitos para superar problemas e atrasos – sejam eles na área politica, social, cultural ou econômica – que os sistemas coloniais deixaram como herança. Não podemos nos esquecer que o continente foi colonizado por diferentes países europeus, com diferentes e conflitantes interesses e só muito recentemente, a partir da década de 60 do século passado, viu nascer os seus primeiros países independentes. Em que países a revista África 21 circula? A África 21 é vendida nas bancas e por assinaturas em Angola e Portugal, chegando ao resto do mundo apenas por assinaturas. Em breve, pretende também ser comercializadas nas bancas em Moçambique, Cabo Verde e Brasil, pelo menos. No Brasil, pretendemos atingir sobretudo o público interessado em assuntos africanos, que por enquanto talvez seja ainda demasiado institucional (políticos, empresários, professores, estudantes, investigadores, etc.), mas acreditamos que em breve esse público se torne mais amplo. Por isso, vamos focar a nossa distribuição, nesta fase, por mailing (vamos apostar forte, por exemplo, nas bibliotecas), mas queremos também colocar a África 21 nas principais redes de livrarias e algumas – poucas – bancas. Que importância tem o Brasil nesse cenário? O Brasil é o segundo país “africano” do mundo, depois da Nigéria. É o maior país de língua portuguesa. É um país ligado a Angola por fortes laços históricos, sanguíneos, culturais (o país africano que mais contribuiu para a formação da nacionalidade brasileira foi Angola) e está a tornar-se, presentemente, um dos seus principais parceiros africanos e internacionais. Uma revista como a África 21 tem de estar, obviamente, no mercado brasileiro. Os africanos e angolanos, em especial, são grande conhecedores e apreciadores dos produtos informativos e culturais do Brasil – como a TV Globo -, mas precisam (e querem) ser também melhor conhecidos pelos brasileiros. A globalização justa tem de ter vários sentidos. Há quem acredite que a economia angolana vá superar a sul-africana já em 2016, como você vê isso? Essa notícia realmente circulou, mas não foi bem explicada. Não parece crível que, apesar do crescimento que Angola teve nos últimos anos, supere o PIB sul-africano daqui a quatro anos. Uma coisa é certa: Angola é dos países africanos que mais cresce e está investindo em infraestruturas aceleradamente, o que, a médio prazo, terá um retorno inevitável. Mas precisa, por exemplo, ultrapassar a sua atual dependência do petróleo. Se Angola conseguir transferir os recursos obtidos com o petróleo para a indústria e a agricultura, de uma forma equitativa em todo o país, dará um salto muito grande. Já a economia sul-africana é muito mais pujante, com indústria diversificada e agricultura forte, mineração consolidada, alto nível de consumo. Nada disso se alcança em poucos anos, mesmo com investimentos maciços.

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